terça-feira, 18 de junho de 2013

É LÍCITO A UM CRISTÃO PARTICIPAR DE PASSEATA?





1 Não espalharás notícias falsas, nem darás mão ao ímpio, para seres testemunha maldosa. 2 Não seguirás a multidão para fazeres mal; nem deporás, numa demanda, inclinando-te para a maioria, para torcer o direito. 3 Nem com o pobre serás parcial na sua demanda. 4 Se encontrares desgarrado o boi do teu inimigo ou o seu jumento, lho reconduzirás. 5 Se vires prostrado debaixo da sua carga o jumento daquele que te aborrece, não o abandonarás, mas ajudá-lo-ás a erguê-lo.[1]
(Êxodo 23.1-5)

Eu desde a minha adolescência ouvia e ouço que, um cristão não deve participar de uma passeata, porque a Bíblia orienta assim. Particularmente, já li a Bíblia algumas vezes e nunca tinha lido algo a respeito que fosse contrário a esse tipo de conduta popular ou manifestação. O grande estadista Moisés regulamenta o assunto no Livro de Êxodo e há ao longo do Antigo e Novo Testamento registros de vários tipos de manifestação popular, que não comentaremos aqui, pois fogem ao objetivo desse artigo. Mas afinal é lícito a um cristão participar desse tipo de manifestação? Vejamos então.
Comecemos do início, o que vem a ser uma passeata? Vejamos o que o Aurélio diz respeito. Substantivo Feminino que 1) Significa pequeno passeio; volta, giro. 2) No português brasileiro significa marcha coletiva em sinal de regozijo, reivindicação ou protesto cívicos, ou de uma classe; caminhada. Agora vejamos no Dicionário Houaiss: Substantivo feminino que indica 1) ligeiro passeio, giro, volta; 2) No regionalismo do Brasil: Marcha coletiva empreendida por grupo ou categoria para realizar protesto, reindicação, manifestação de solidariedade etc., ou para expressar regozijo por alguma coisa; caminhada.
Como se pode perceber não há nenhuma diferença substancial entre os significados demonstrados em ambos os Dicionários. Faremos uma análise sumária a partir dos sentidos acima expostos:
Passeata é um passeio ligeiro, de curta duração. Um andar coletivo, por exemplo, no Rio de Janeiro, seja na Av. Presidente Vargas ou Av. Rio Branco é um passeio que de modo individual ou coletivo não demorado, mas rápido. Nesse sentido, tudo bem.
O outro sentido é de marcha coletiva em sinal de regozijo por alguma coisa. Quanto a isso não há nada de regozijo, mas também não significa que os que fazem passeatas no momento estão amargurados e totalmente infelizes. Porém, não é nenhum carnaval e nem tem bandeiras partidárias.
Passeata é a reivindicação ou protesto cívico. Quanto à reivindicação é o que a passeata quer demonstrar, uma demanda que protesta e reprova de modo pacífico, mas veemente o aumento abusivo das passagens dos coletivos. Esse aumento foi de R$ 0,20 (vinte centavos), mas não é apenas isso. Há uma imensa insatisfação no povo brasileiro que vê suas economias pessimamente administradas. Há um descontentamento generalizado pela corrupção que assola o país por meio das obras superfaturadas dos estádios de futebol e demais obras públicas. A maneira como tratam o dinheiro público exigindo o máximo do povo em troca de cestas básicas e dando-lhe o pior atendimento nos hospitais.
Passeata é uma caminhada. De fato é uma caminhada de curta duração, mas uma caminhada de repudio a esse sistema viciado que é, um devorador em que não há dinheiro que chegue. É um manifesto político sem bandeira partidária, pois se trata de uma reação da coletividade que não aguenta mais tanta sordidez de políticos, juízes e demais funcionários públicos inescrupulosos. Políticos que negociam seus votos e seus favores a uma minoria que só quer ganhar sem trazer benefícios na saúde, nos portos, nas estradas, na educação etc.
Agora retornemos ao ponto de origem, quanto à licitude de o cristão participar ou não de passeatas. Penso que pelo bom senso, o exposto acima já diz por si só, e o cérebro recebemos para pensar. Todavia, vamos lá. A Bíblia é um livro que expõe e prega o princípio da verdade e repudia a exploração e corrupção. Ela está recheada de denúncias aos reis, políticos e juízes ao longo de sua narrativa histórica e profética. Ela demonstra como indivíduos e o próprio povo foi injustiçado e explorado muitas vezes. A temática bíblica está em torno da verdade e da justiça que deve ser buscada e aplicada cotidianamente. Isso é tão sério que Moisés determinou que: “Não espalharás notícias falsas, nem darás mão ao ímpio, para seres testemunha maldosa”, Ex 23.1. Basta uma notícia para se ter resultados imprecisos, manipulados e injustos.
Vamos agora ao que a Bíblia diz a respeito de passeata: “Não seguirás a multidão para fazeres mal”, Ex 23.2a. O texto diz, “Não seguirás a multdião...” e muitos com quem conversei a respeito param aí, mas o texto continua: “... para fazeres”. Nenhuma multidão deve ser seguida se ela tem como finalidade clara de fazer mal, mas que tipo de mal? Se formos até aí no texto, ficaria muito vago o entendimento, mas o texto prossegue. Ele continua: “nem deporás, numa demanda, inclinando-te para a maioria, para torcer o direito”. Fazer “o mal” é esclarecido como “torcer o direito” de alguém, e isso é anticívico e antibíblico. Mesmo que tal reivindicação seja de uma maioria, mas se for algo injusto seria ilegítimo, ilegal e até pecaminosa uma passeata assim.

Devemos nos lembrar que quando os filhos de Israel saíram do Egito e se fixaram em Canaã tinham uma noção clara de pertencimento a uma nação e a civilidade. O próprio sistema legal deles é uma herança a toda humanidade neste sentido. O cidadão israelita não poderia se unir a uma multidão para torcer o direito de quem quer que fosse, ainda que fosse de uma minoria, pessoa pobre ou rica. Ningém tem o direito de se beneficiar pelo fato de ser minoria ou pobre, mas a justiça e medidas justas são para todos. Além da Bíblia o cidadão cristão tem a Constituição Federal que lhe diz acerca de participação de reuniões públicas:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;

Assim concluímos que os cristãos participam sim de reuniões desde que a causa e motivação sejam justas. Entretanto, o cristão verdadeiro não se une a baderneiros, que depedram o patrimônio público ou provoquem os policiais, apenas exerce o seu direito como cidadão.








[1]Sociedade Bíblica do Brasil: Almeida Revista E Atualizada - Com Números De Strong. Sociedade Bíblica do Brasil, 2003; 2005, S. Êx 23:5

4 comentários:

  1. Eis a questão, como fazer passeata, mesmo tendo o direito,e com toda liberdade garantida pela constituição, sem se misturar com pessoas que vão sem saber por que estão indo. Durante o movimento se alteram, distroi patrimonio público, irritam policiais, fazendo o que satanaz quer, matar, roubar e destruir. Será que a Bíblia também não nos ensina outras maneiras de recebermos nossos direitos e de viver bem e desfrutar desta Terra. Por que Paulo Escreveu em Filipenses 4.6. Pense Nesta outra maneira.

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    1. Olá Jefte Hugo, agradeço a sua participação e crítica ao artigo. Pois ela é de grande valor e nos ajuda ver determinadas coisas que talvez não estejamos vendo. Caro amigo, porém nosso problema quanto a participação em passeatas é mais de natureza histórica-cultural. Nosso país é predominantemente católico desde sua colonização e os missionários que chegaram aqui no fim do século XIX eram presbiterianos, metodistas e batistas principalmente. Eles eram muito atuantes politicamente em suas terras de origem, entretanto, ao chegarem aqui como imigrantes não podiam se envolver em questões políticas. Eis o motivo porque ensinavam aos seus rebanhos em tom imperativo: Crente não se envolve em política. Com isso muitos concluíram que política é coisa de Satanás. Mas não é bem assim que esse assunto deveria ser visto. Conclusão, por isso que ainda hoje temos muita resistência quanto ao exercício integral da nossa cidadania, da participação político partidária e até em fazer manifestações. Note que historicamente apenas a partir da segunda República que uns poucos protestantes ingressaram na política e fizeram parte da Constituinte de 1934. Então como se vê nosso problema é histórico e não conceitual apenas. Se você ou quem quiser poderá ler: SOCIOLOGIA DA RELIGIÃO E MUDANÇA SOCIAL, (orgs. Beatriz Muniz de Souza e Luís Mauro Sã Martino), Editora Paulus, Edição 2008; ps.67-77. Ele trás maiores esclarecimentos.

      Muito obrigado, fica na paz.

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  2. Esse tema é pertinente num tempo que nossa juventude precisa dessas respostas, trazendo argumentos e uma boa leitura sobre a questão.
    Concordo, devemos nos fazer representados e manter nossa conduta de fé e exemplo, manifestando nossa indignação diante desse governo e da forma de politica atual.

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  3. Precisamos nos empoderar, ou seja, sermos mais conscientes dos nossos direito e deveres como cidadãos. Foi-se a época em que os cristãos não deveriam se engajar politicamente, até para proteger aqueles que nos pastoreavam vindo do estrangeiro. Temos que reagir para garantir para os nossos descendentes uma vida digna, como na Suécia, na Suiça ou Finlandia. Para isso tem que se acabar com as propinas, roubos, desvios, etc. Por isso devemos nos manifestar!

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